O Tempo passa sem parar, como um rio que corre em direcção ao mar, dissipa-se nas brumas da Memória colectiva... É o Tempo que serve a memória ou é a memória que serve o Tempo?
quarta-feira, 16 de abril de 2014
Seven - Sete Pecados Mortais – O Triunfo do Mal
O filme do género policial, habitualmente,
remete-nos para assaltos ou roubos, para ladrões e polícias que, geralmente,
depois duma cuidadosa investigação, acabam por se envolver em perseguições e
tiroteio. Recentemente surgiu dentro do género, uma nova vertente que envolve
“crimes em série”, ou seja crimes que ocorrem durante algum tempo, em
determinados locais e, á partida, sem ligação entre si, perpetrados por “
Serial Killers”, dos quais o mais famoso é “Hannibal “The Canibal” Lecter”
brilhantemente interpretado no cinema por Sir Anthony Hopkins no multi–premiado
“Silence of the Lambs – OSilêncio dos
Inocentes” (Jonathan Demme, 1991)e também na sequela“Hannibal” (Ridley Scott, 2001) e respectiva
prequela, “Red Dragon – Dragão Vermelho” (Brett Rattner, 2002). Em 1995 “Seven
- Sete Pecados Mortais” levou o tema do“Serial Killer”um pouco mais longe.
David Mills é um detective recém-
transferido para o departamento de homicídios de uma grande cidade onde vai
fazer parelha com William Somerset, um detective veterano que está para se
reformar. Os dois começam a investigar um estranho homicídio e rapidamente
chegam á conclusão que este foi meticulosamente planeado com alguns requintes
de sadismo. Quando ocorre um segundo homicídio, igualmente meticuloso, estranho
e sádico, os dois detectives começam a aperceber-se que alguém pretende usar os
“Sete Pecados Mortais” como arma de crime.
Escrito porAndrew Kevin Walker enquanto viveu em Nova York e tentava ser escritor
de argumentos, Walker não gostou da sua estadia na cidade e “Seven” reflecte um
pouco essa experiência, já que, nas suas próprias palavras “ é verdade que se
eu não tivesse vivido lá, eu provavelmente nunca teria escrito “Seven”,e quando finalmente conseguiu escrever
qualquer coisa, pensou no actor William Hurt para desempenhar o papel de
William Somerset, cuja personagem foi baptizada com o nome do autor favorito de
Walker, W. Somerset Maugham. Um primeiro esboço foi entregue á New Line que
recusou por considerar demasiado violentas algumas cenas, principalmente a cena
final, optando por um final com elementos mais tradicionais, próprios de um
thriller de detectives e mais cenas de acção. Andrew Kevin Walker entregou um
segundo argumento que, após diversas recusas, acabou por ficar esquecido dentro
de uma qualquer gaveta dos executivos da distribuidora.
Andrew Kevin Walker
Foram considerados diversos realizadores e
até actores para trabalharem no filme. Inicialmente era Jeremiah S. Chechik,
autor de “Benny and Joon” (1993), o realizador escolhido pela New Line para o
fazer e o actor seria Al Pacino, que acabou por desistir em favor de “City Hall
– A Sombra da Corrupção” (Harold Becker, 1996). Após Pacino desistir, Chechik
seguiu o mesmo caminho por discordar do final do filme que a distribuidora quis
lançar, tornando o filme mais tradicional e próximo da clássica história
detectivesca. Com o projecto a meio-gás, mas sem realizador, Michael De Luca,
presidente da distribuidora resolveu enviar o argumento original a David Fincher, cuja primeira experiência
cinematográfica não correra bem e o realizador não tinha vontade de voltar a
filmar, apesar de estar disponível e dando-lhe luz verde para filmar. A
história agradou-lhe pois viu ali a possibilidadede contar uma história psicologicamente
violenta e quase desumana cujas implicações eram não tanto “porque se faz”, mas
sim “como se faz”, além de a achar mais uma meditação sobre o mal do que um
policial com todas as regras normais numa produção típica do género.
Realizado por David Fincher, que fora
técnico de Efeitos Especiais na “Industrial Light & Magic” de George Lucas
antes de se tornar realizador de publicidade e posteriormente realizadou videoclips para nomes sonantes como Sting,
Madonna, Rolling Stones, Billy idol, Michael Jackson, entre outros, deu nas
vistas quando realizou o videoclip “Self Control”, o tema interpretado por
Laura Brannigan onde mostra um seio da cantora. Catapultado para a fama, veio a
realizar “Alien 3 – A Desforra”, em 1993, mal-amado pela crítica e pelo
públicopor ser demasiado
filosóficoem vez de terror e acção como haviam sido os seus antecessores; entre
este “Seven”e a sua obra-prima chamada
“Fight Club – Clube de Combate” (1999) , fez “The Game – O Jogo” em 1997 com
Michael Douglas e Sean Penn. A sua abordagem a “Seven” é feita num estilo
documentário, inspirada em diversas séries de televisão e no policial clássico
“The French Connection – Os Incorruptíveis contra a Droga” (William Friedkin,
1971).
Logo desde o início que se percebe que este
filme não será o típico thriller a que nos habituamos a ver: o genérico inicial
corre sobre imagens de alguém, algures numa zona da cidade a cozer tiras de
papel, a escrever páginas e a raspar a pele dos dedos. Presumivelmente é John
Doe a preparar o seu trabalho e a dar ao espectador uma ideia do tipo de
pessoas que os detectives vão ter pela frente: metódico e organizado.
Coma acção situada numa qualquer cidade(nunca se chega a saber o seu nome), ruidosa, cheia de gente estranha e
onde chove constantemente(talvez um
piscar de olhos à Los Angeles de 2019 de “Blade Runner – Perigo Eminente”,
segundo Ridley Scott) agindo como uma força opressiva á investigação dos
detectives, era assim que Fincher queria mostrar aquela cidade, nas suas
palavras “queria aquele mundo sujo, violento, poluído e, por vezes,
deprimente...tudo tinha de ser autêntico e o mais cru possível, só assim é que
o filme resultaria...”, ou seja, por resultados, entenda-se choque e era isso
mesmo que Fincher queria: chocar audiências e, tendo um argumento que o iria
fazer, nada melhor do que escolher um elenco onde esse choque resultasse para
todos e ficava-se com o melhor de dois mundos: um grande filme e grandes
interpretações.
Brad Pitt, recém-chegado de “Legends of the
Fall – Lendas de Paixão”(Edward Zuick,
1995), foi contactado por Fincher que o vira nesse filme e ficara impressionado
com o seu potencial, leu o argumento e ficou entusiasmado com a possibilidade
de compor a complexa personagem do Detective David Mills, jovem detective,
recém-chegado aquela metrópole, que desconhece as amarguras da vida nas grandes
cidades, casado com uma bonita e insegura jovem (Gwyneth Paltrow), e que, com o
avançar da investigação, começa a conhecer um outro lado que até aí lhe passara
ao lado, principalmente quando aceita a ajuda do veterano detective
soberbamente interpretado por Morgan Freeman. Somerseté um homem experiente que viveu sempre no meio daquele
universo sujo e decadente, tem um segredo obscuro no seu passado, e, agora que
está á beira da reforma, não se quer envolver naquele caso, mas, ao mesmo
tempo, sente que deve ajudar Mills.
A dado momento, quase no final, Sommerset,
em conversa com Mills, diz-lhe “Sabes que isto não vaiacabar bem”, Mills não concorda e diz que
apanhar John Doe é apenas uma questão de tempo, ao que Somerset contrapõe
lembrando que o criminoso já cumpriu quatro dos sete pecados mortais. Logo a
seguir, quando é descoberto o quinto cadáver, é que nos começamos a aperceber
que Somerset poderá ter razão no que diz. Acontece então o primeiro momento
chocante do filme: John Doe (literalmente, “João Ninguém”), o “Serial Killer”, brilhantemente
interpretado por Kevin Spacey (o actor que recebera um Oscar de Melhor Actor
Secundáriopela sua interpretação em “Os
Suspeitos do Costume” de Bryan Singer (1995), pediu á produção para não incluir o seu nome
no genérico inicial, para assim acentuar o efeito choque da sua aparição), entra em cena, todo ensanguentado para se entregar aos dois
detectives. Nunca se havia visto nada assim no cinema policial nem em nenhuma
das suas diversas vertentes. É mais uma regra que “Seven” e David Fincher vieram quebrar.
Esta entrega voluntária (ou não, caberá a
cada um ajuizar nesse sentido), do "Serial Killer" baralha as contas aos dois detectives e começa
um jogo de vontades que durará até ao final, entre o maduro e cerebral Somerset
,o jovem e cabeça dura Mills e o meticuloso, frio e calculista John Doe que alega
conhecer o paradeiro dos dois cadáveres que faltam e confessará os crimes, se
forem os dois detectives a conduzi-los ao local onde se encontram, ou então
alegará insanidade mental. Decidido a acabar com aquele caso, Mills aceita a
condição, apesar das reservas e preocupação de Somerset. Tudo isto nos leva a
uma das mais assustadoras cenas de que há memória no género desde “Manhunter –
Caçada ao Amanhecer” (Michael Mann, 1986) a primeira aparição (embora
secundária) de Hannibal Lecter na sétima arte: durante a viagem para o local
onde Doe diz estarem os cadáveres em falta, este diz que foi Deus que o mandou
punir “aqueles inocentes”, como lhes chama Somerset e explica que os seus actos naqueles dias
serão estudados, analisados e seguidos, além de tecer alguns comentários a
Mills. Somos então conduzidos pela mão segura de Fincher até ao segundo momento
chocante do filme: o final, quando são revelados os dois últimos pecados e
permitindo que o mal, personificado por John Doe triunfe causando danos
irreparáveis nas personagens.
O impacto do final é tão chocante e
inesperado que foi estudada a possibilidade de existir um final alternativo,
que chegou, inclusive, a ser desenhado em “Storyboard”, mas Fincher não o quis
utilizar, alegando que seria “contra-natura” utilizar-se outro final que não o
previsto,no que foi secundado por Brad
Pitt.
Estreado a 22 de setembro de 1995, o filme
rendeu cerca de 13.900.000 de dólares na primeira semana, totalizando cerca de 100.100.000 de dólaresnos Estados Unidos e cerca de 227.100.000 de
dólares no resto do mundo, fazendo com que “Seven - Sete Pecados Mortais” fosse
o sétimo filme mais visto em 1995.
Indiscutivelmente um dos grandes filmes da década de 90 do século passado.
Nota: as imagens e video que ilustram o texto foram retiradas da Internet
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