terça-feira, 18 de junho de 2013

Duas Perspectivas Diferentes, O Mesmo Cenário I



                                - As Bandeiras dos Nossos Pais

   
Em 1962, “The Longest Day – O Dia mais Longo”, uma superprodução de guerra sobre o dia D – o desembarque aliado na Normandia e que foi o ponto de viragem da II Guerra Mundial na Europa. Filmado a preto-e-branco, permitiu na altura, juntar imagens documentais ás cenas filmadas com actores reais e tornar o filme uma referencia no panorama da superprodução. A grande novidade deste filme foi o facto de ser filmado por três realizadores por forma a apresentar três perspectivas diferentes da operação: Ken Annakin filmou os segmentos britãnicos; Andrew Marton encarregou-se dos episódios com as forças americanas; e Bernhard Wicki tratou dos segmentos alemães. No conjunto, os três pontos de vista formaram uma visão conjunta, antes, durante e depois do desembarque e tornaram este filme, vencedor de dois Oscares da Academia, um clássico incontornável do cinema.
   
Alguns anos depois, em 1970, “Tora, Tora, Tora” apresentava uma reconstituição do ataque japonês a Pearl Harbor. Richard Fleischer e Kenji Fukasaku foram os realizadores encarregados de mostrar os pontos de vista de ambos lados. O filme, vencedor de um Oscar da Academia, não foi o sucesso esperado mas tornou-se, com o passar dos anos, um filme cada vez mais e mais revisitado por cineastas e outros interessados. O formato não convenceu e foi preciso esperar pelo sucesso mundial de “Saving Private Ryan – O Resgate do Soldado Ryan” (Steven Spielberg, 1998) para regressar ao formato da dupla perspectiva de determinado acontecimento. Em 2006, o veterano realizador Clint Eastwood, pegou no formato e fez dois filmes inesquecíveis.
   
   
Parece difícil pensar que haja alguma coisa sobre a IIªGuerra Mundial que ainda não tenha sido objecto de análise, reconstituição ou mesmo adaptação para o grande ou pequeno écran. No entanto foi isso mesmo que Clint Eastwood quis fazer quando leu “Flags of Our Fathers – As Bandeiras dos Nossos Pais”, o livro de James Bradley e Ron Powers onde se descreve como as vidas dos três sobreviventes que estiveram envolvidos no Içar da Bandeira Americana em Iwo Jiwa, em fevereiro de 1945, imortalizados pela fotografia que Joe Rosenthal da Associated Press lhes tirou, se alteraram após aquele momento e do aproveitamento que o governo faz, ao transformá-los em celebridades apresentadas em paradas e outras celebrações, apresentando-os como porta-voz no esforço de guerra.
   
O argumento, escrito por William Boyles, jr. e Paul Haggis, adapta muito do material escrito, oscila entre três períodos temporais: Iwo Jiwa, a tournée em prol do esforço de guerra e no presente. É nos destinos de cada um dos heróis que o filme evolui do mediano filme de guerra para um trabalho interpretativo de grande qualidade, principalmente no que toca a Ira (uma excelente interpretação de Adam Beach), um índio Pima, que, destroçado pela batalha em Iwo Jiwa, passa a herói dum momento para outro, não aguenta a pressão e tenta esquecer bebendo até cair num verdadeiro oblívio.
    
O Realizador Clint Eastwood
A abordagem de Eastwood é muito cinematográfica. Ele desconstrói a batalha de modo a torna-la uma visão muito mais negra do que a história regista. Aproveita para esse efeito a natureza vulcânica da própria ilha (apesar das sequências de batalha terem sido filmadas na Islândia, porque o governo japonês não autorizou filmagens na ilha por a considerarem solo sagrado), o realizador e Tom Stern, director de fotografia, usando filtros especiais, tiram alguma da cor dando a sensação de que as cenas na ilhas são filmadas a preto-e-branco e quase parece impossível que haja alguma coisa viva naquela local de tão assustadoras e surreais que  são as imagens. Eastwood coreografa as cenas de batalha de um modo tão caótico, a fazer lembrar o início de “O Resgate do Soldado Ryan”, focando a atenção (sua e dos espectadores) nos movimentos das tropas em vez de ser na realização, “colando” a câmera aos soldados  e depois quando acontecem barragens de fogo, a correr ao lado deles como se procurasse abrigo. 
   
A maior parte dos filmes de guerra, mesmo aqueles que se dizem anti-guerra, aberta ou implicitamente abraçam a violência e veem-na, politica ou cinematograficamente, como um meio para atingir um fim. Poucos são os realizadores que conseguem resistir á visão de um míssil a explodir e ao espectáculo da morte; a violência é simplesmente demasiado excitante para se evitar. E Eastwood não se esquiva a esta realidade, bem pelo contrário, como fica bem demonstrado em “ As Bandeiras dos Nossos Pais”. Somos conduzidos ao coração da violência e ao coração dos homens, vemos até onde é possível ir, com a mesma facilidade com que vemos grutas onde  soldados são  torturados até á morte ou sucumbem á loucura ou assistimos ao fogo-de-artíficio num qualquer dia festivo. O filme apresenta-nos esta visão cruelmente e Clint Eastwood defende-se dizendo “Que era importante para o público perceber aquilo porque estes três homens passaram, aquilo a que se dedicaram e o que herdaram e o que é ter aquela sensação de falsa celebridade…” e tinha toda a razão do mundo!
   Recebido com entusiasmo pela crtíca e público, o filme não foi, no entanto, o sucesso esperado. Clint  Eastwood foi nomeado para um Globo de Ouro como Melhor Realizador e o filme recebeu duas nomeações para os Oscares da Academia. Em alguns sectores da sociedade, o filme foi considerado uma obra séria e patriota já que honra todos aqueles que combateram no pacífico e, ao questionar a versão oficial da verdade, lembra-nos que super-heróis existem apenas nos livros de Banda Desenhada e nos filmes de animação. Com “Letters from Iwo Jiwa – Cartas de Iwo Jiwa”, o caso foi diferente.
                                                                                                                   (continua)



Nota: As imagens e vídeo que ilustram este texto foram retiradas da Internet
                                       

2 comentários:

  1. Gostei Muito de suas percepções cinematográficas!!

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    1. obrigado, camila pela sua apreciação deste texto. espero que também goste do que se lhe seguir acerca de "Cartas de Iwo Jima"
      cptos

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