domingo, 28 de abril de 2013

O Conde Monte Cristo II - A Mão do Finado - A Continuaçao quase desconhecida



   Ao contrário de muitos escritores  franceses, contemporâneos de Alexandre Dumas, Pai,  ele tornou-se rico ainda em vida. Tinha leitores espalhados um pouco por todo o mundo e qualquer obra com a sua assinatura era êxito garantido. Portanto nada havia de estranho quando em 1853, surgiu no mercado uma obra, assinada por Alexandre Dumas, Pai, intitulada “ A Mão do Finado” e que fora apresentada como uma continuação de “O Conde Monte Cristo”.  O sucesso foi imediato, mas a história por detrás desta continuação  é bem diferente.
   Antes de entrarmos propriamente na obra em si, vale a pena ter em atenção o seguinte diálogo, ocorrido em lisboa entre Luis Correia da Cunha, editor das obras de Alexandre Dumas, Pai, em Portugal e um tal Alfredo Possolo Hogan, funcionário dos correios de lisboa. Possolo Hogan era um apaixonado pela literatura, particularmente pelo romance de aventuras, escrevia nas suas horas vagas e, encontrando-se sem dinheiro, resolveu apelar ao conhecido editor:
- Já viu isto!? “O Conde Monte Cristo” é aquilo que os meus fregueses preferem! Vende-se tudo, nem tenho mãos a medir!! – dizia o atarefado editor
- Vai reeditá-lo? – perguntou Hogan
- Vou, está claro…mas estive a pensar numa continuação do “Conde Monte Cristo”, produção particular aqui da casa…e quem poderá arcar com tal responsabilidade? – o editor pareceu ponderar um pouco e depois olhou para o seu interlocutor – você!
- Eu? – fez Hogan, sem poder acreditar no que ouvia
- Sim, você. Não é, por acaso, autor de romances do mesmo género, como “Os Dois Angelos”, ou “Um casamento forçado”?...se leu os meus fascículos, não tem mais do que tomar os personagens  e, com eles, compor o fim que falta ao romance de Alexandre Dumas…publica-lo-ei nesta colecção e com a assinatura do autor de “Os Três  Mosqueteiros”…
- Mas poderá ser preso! Incorrer numa contrafacção por uso indevido de nome!
- Não creia nisso…Alexandre Dumas está muito ocupado a provar que é ele próprio quem escreve os seus romances…estou em crer que ele até vai apreciar devidamente este golpe publicitário…
Alfredo Possolo Hogan, depois de muito pensar, disse:
- Está bem! Aceito a incumbência…mas acontece que estou muito necessitado de três meias coroas…
    Passaram-se dois anos depois dos acontecimentos narrados em “O Conde Monte Cristo”. O Conde vive agora feliz ao lado de Haydée, o seu amor, mas é do seu passado que surge ameaça. Benedetto, antigo colaborador na vingança que o Conde levou a cabo, encontra-se preso por homicídio e, enquanto aguarda o julgamento, recebe  uma carta que lhe revela a sua verdadeira identidade e onde também lhe é pedido que  se vingue do homem que o salvou, protegeu e depois o abandonou á sua sorte: Edmond Dantés, conhecido como  O Conde Monte Cristo.
   
Utilizando a mesma estrutura folhetinesca, da qual era bastante conhecedor, Possolo Hogan foi muito criativo na produção do final para “O Conde Monte Cristo”,  em vez de encarar a história como um mero desenvolvimento do tema da vingança, constante no romance de Dumas, demarca-se dele,  vai mais além e obriga a uma reflexão sobre o trajecto de Dantés em ambas as obras. Tal como a obra de Dumas, o enredo de “A Mão do Finado”, também é cheio de peripécias, encontros inesperados e algumas reviravoltas que a diferenciam da primeira obra, mas que, ao mesmo tempo, as tornam indissociáveis: as histórias de Dantés e Benedetto são explicadas como sendo uma “vontade de Deus”, ou seja, tanto na construção desta continuação, como do próprio “Conde de Monte Cristo”, o motor da acção, não seria um desejo pessoal, mas “uma força superior” que a todos conduz. Aqueles que ultrapassam os limites, chegando mesmo a atingir inocentes, serão punidos, assim como aqueles que se arrependem, também não ficam impunes se tiverem cometido excessos. É esta a perspectiva ideológica presente no romance, uma espécie de “mão Divina” que, não existindo,  nos daria a sensação de estarmos perante uma sucessão de episódios inconsistentes.
   Possolo Hogan exagera no final, tal como qualquer folhetim,  ele reserva a morte como destino final das principais personagens do romance e, influenciado pelo romance negro, comum na época, ele finaliza com um toque macabro com o vingador, Benedetto, também ele vitimado destino, terminada a sua vingança, volta a França para depositar “A Mão do Finado”, símbolo da sua missão,  no túmulo do pai, antes de ser preso e condenado á morte pelo assassinato do carcereiro da prisão de onde se evadiu no passado.  
   Publicado em Portugal em 1853, foi um enorme sucesso, sendo reeditado pelo menos três vezes até 1857. Ao longo dos séculos XIX até ao XXI, o romance acabou por ser incorporado na obra de Alexandre Dumas, Pai, que tomou conhecimento da sua existência. Terá escrito uma carta a negar a autoria do romance e pedido ao editor português para o ajudar a desmentir tal facto, já que nunca fora sua intenção fazer, embora lho tivessem solicitado inúmeras vezes, uma continuação do romance. Nada foi feito, já que o sucesso estava garantido.  Mas a verdadeira autoria do romance permaneceu durante muito tempo ignorada e hoje em dia continua a ser atribuída a Alexandre Dumas, Pai.
   Quando se escreve um romance cujo objectivo principal é concluir um outro, como “A Mão do Finado” em relação a “O Conde Monte Cristo”,  fica demonstrada a vitalidade de um grande texto, cuja continuidade pode ser encarada como um dos possíveis desdobramentos desse mesmo texto. Polémicas á parte, Alfredo Possolo Hogan desdobrou uma história, sob o pretexto de concluir aquilo que Alexandre Dumas, Pai, deixou em aberto.  

Nota: as imagens que ilustram o texto foram retiradas da Internet






2 comentários:

  1. extraordinário! Desconhecia totalmente que tinha sido Hogan a escrever " A Mâo do Finado". Li "O Conde de Monte Cristo " e " A mão do Finado " jovem talvez com 16 ou menos... e a ambos voltei várias vezes, muitas ... e a quase todo o Dumas, pai...

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  2. A mão do Finado é um lixo, li aquilo e custei a acreditar que Dumas teria escrito o livro. A história detona com o Conde e desconstrói a saga do livro original, uma porcaria mesmo. Saber agora que foi escrita por um espertalhão usando o nome de Dumas é quase reconfortante, pois agora sei que o grande Dumas não escreveu tal palhaçada!

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