segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Um Violino no Telhado - Porque é que já não se fazem filmes assim?



      Tradicionalmente (já o escrevi) o teatro, particularmente a Broadway, fornece à sétima arte motivos e ideias para filmes. "Um Violino no Telhado", peça teatral estreada  em 1964, baseada nas histórias de Sholom  Aleichem, escritas no início do século XX, é mais um desses exemplos.
     Tevye é leiteiro e judeu que vive na aldeia de Anatevka na rússia em 1905. Trabalha arduamente, quase de sol a sol,  para que nada falte à mulher e ás suas cinco filhas. No entanto, no país, sopram ventos pré-revolucionários que mais tarde ou mais cedo irão chegar à aldeia e alterar radicalmente as vidas e também os costumes e tradições dos seus habitantes.
     Depois de um fabuloso prólogo, ao som de “Tradition”, graças a uma montagem quase hilariante em que a justaposição de uma atitude quase operática dos habitantes de Anatevka, com a coordenação rítmica das tarefas do dia-a-dia, como a curtição de peles, trabalhar a madeira, o arranjo do peixe, a costura ou o talhante a pendurar a carne nos ganchos,  em que Tevye nos vai apresentado figuras e factos da sua aldeia, faz a sua distribuição diária de leite e antes do genérico inicial, sobre um magnífico nascer do sol, ao som de um violino,  já o espectador se sente familiarizado com ambientes  e  personagens que desfilam no écran, graças, não só á maravilhosa fotografia de Oswald Morris que tira o melhor partido dos cenários do filme, mas também  à realização cuidada e certinha de Norman Jewison.
Norman Jewison
     O realizador,  autor de uma vasta filmografia onde se incluem títulos como "In the Heat of the night - No Calor da Noite" (1967), thriller policial com contornos racistas e vencedor do Oscar de Melhor Filme do Ano; "The Thomas Crown Affair – O Grande Mestre do Crime" (1968), um policial detectivesco tipo gato e rato; "Jesus Christ Superstar" (1973) nova adaptação de uma peça musical da Broadway sobre a última semana de Cristo na terra; "Rollerball - Os Gladiadores do séc.XXI" (1975) ficção científica em jeito de filme-denúncia sobre o sistema governativo no futuro; ou “…And Justice for All -…E Justiça para Todos” (1979), uma brilhante sátira ao sistema judicial americano,  que, em vez de se limitar a adaptar a peça teatral, considerou que o material lidava com assuntos sérios e delicados, resolveu fazer uma aproximação o mais realista possível. Por razões políticas, a produção foi proibida de filmar na União Soviética. Foi na  antiga Jugoslávia que encontrou o tão almejado realismo e que fez o filme,  contando para isso com o apoio do governo, já que o presidente Tito era um grande fan de cinema. Mantendo intacta a estrutura da peça teatral,  apenas acrescenta uma cena que mostra Perchik a ser preso numa grande manifestação em Moscovo e, por uma questão de duração do filme, omite as  canções “Now I have Everything” e “The Rumor”.  

      Durante cerca de três horas, Norman Jewison,  realizador formado na escola da televisão, na qual foi produtor e realizador em diversos  programas de entretenimento e  de vertente musical, filma e ilustra  as  tradições do povo judeu com cenas e canções, que surgem espontaneamente sem prejuízo da acção, como "Sabbath Prayer" (durante o sabbath); a celebração do contrato de casamento entre a casamenteira e Golda, mulher de Tevye e entre este e Lazar Wolf; a cerimónia de casamento com a fabulosa dança das garrafas (com as personagens a cantar "Sunrise, Sunset", enquanto se encaminhem para o casamento); ou a inesquecível canção "If I Were a Rich Man" em que Tevye canta e dança no estábulo entre os seus animais. Consegue fazer-nos rir em cenas como as conversas de Tevye sobre o casamento das filhas mais velhas,  em que um plano de câmara estudado, cria uma imagem, dando ao espectador a sensação de afastamento, no qual Tevye conversa com Deus; Entramos no domínio do sobrenatural na sequência do sonho (inventado) de Tevye.  Mas também consegue deixar-nos pouco à vontade em cenas como a carga da polícia sobre os convidados na festa do casamento onde, num fabuloso grande plano, vemos um Tevye incrédulo a olhar para o céu como que a questionar Deus sobre o porquê daquela carga; ou toda a sequência final do êxodo de Anatevka.
Topol, no papel da sua vida
     Todo o elenco,  faz um trabalho sem qualquer mácula. As personagens são tão reais, tão terra-a-terra que se torna difícil escolher uma que seja. Elas são fortes, trabalhadoras, têm  os seus objectivos perfeitamente delineados. Mas é  Tevye, interpretado por Chaim Topol, o centro desta história rodopiante, é ele, como qualquer ser humano que se preze, quem luta diariamente para poder acompanhar as rápidas mudanças do mundo. Agarra-se ao passado e ás tradições, tentando impedir que essas mudanças ocorram no seio da sua família, no entanto aceita aquilo que o futuro lhe possa trazer
O simbolismo de Um Violino no Telhado
    "Um Violino no Telhado" foi um enorme sucesso nos teatros em todo o mundo onde foi apresentado, inclusive a versão portuguesa da peça, a cargo de Filipe La Féria, foi um estrondoso sucesso neste país de brandos costumes mas com  muita tradição neste campo. Tanto a peça como o filme seriam algo absolutamente banal, não fosse a excelência da música de Jerry Bock e das letras das canções da autoria de Sheldon Harnick, canções que evocam alegria e tristeza  e que captam  o drama e o conflito da história apoiados no som assustadoramente belo do violino de Isaac Stern, que , de resto, está sempre presente ao longo de todo o filme, como uma espécie de lembrete metafórico dos medos e perigos que desde sempre acompanham o povo Judeu. Adquire maior significado na cena final quando Tevye o vê e o  convida a ir com ele na viagem, simbolizando que as suas tradições estarão sempre com ele.  
     O filme foi nomeado para oito Óscares da Academia, incluindo Melhor Filme e Melhor Realizador do Ano, venceu três: Melhor Som, Melhor Fotografia e Melhor Banda Sonora Adaptada para John Williams que, anos mais tarde, viria a compôr as bandas sonoras de sucessos como "Star Wars", "Tubarão", "Salteadores da Arca Perdida" ou "E.T." entre muitas outras.
      Para Norman Jewison, "Um Violino no Telhado" foi um grande momento na  sua carreira durante a década de 70 e ainda hoje é considerado um dos seus melhores filmes. Para o público cinéfilo e que gosta destas coisas, fica a pergunta: porque é que hoje já não se fazem filmes assim?





Nota: As imagens e vídeo que ilustram o texto foram retirados da Internet

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